SÓ GOZO COM QUEM DÁ

quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

PERGUNTA

François Silvestre


Alguém se lembra de Chardin?

Agora em janeiro faz quarenta anos da terceira edição em português d’O Fenômeno Humano, de Teilhard de Chardin, uma das mais instigantes e belas obras do pensamento humano, no que se refere às dúvidas e angústias da formação do Universo e do homem nele contido.

Chardin era padre, mas antes disso era biólogo, paleontólogo, filósofo e humanista. Sua observação do Mundo sobre a evolução da vida provocou a ira da cúria romana e do pensamento conservador do cristianismo. Chardin nunca questionou a existência de Deus. O que ele demonstrou foi a inconsistência da criação divina pelos métodos bíblicos.

“Deslocar um objeto para trás no passado equivale a reduzi-lo aos seus mais simples elementos. Seguidas tão longe quanto possível na direção das suas origens, as últimas fibras do composto humano vão confundir-se aos nossos olhos com o próprio estofo do Universo”.

Não é só a citação que chama o atento para a simplicidade profunda da reflexão. Nota-se que Chardin sempre coloca a palavra “Universo” com letra inicial maiúscula. E não é por regra ou sugestão gramatical. Simplesmente ele confunde propositadamente o Universo com Deus. E aí acaba dando ao sentido divino uma conotação de impessoalidade. Conceituação que irritou profundamente os teólogos e a cúria.

“A história e o lugar da Consciência no Mundo permanecem incompreensíveis para quem não tenha visto, previamente, que o Cosmo em que o Homem se encontra implicado, constitui, pela integridade inatacável do seu conjunto, um Sistema, um Totum e um Quantum: Um Sistema pela sua Multiplicidade, - um Totum pela sua Unidade, - um Quantum pela sua energia. Todos três, aliás, no interior de um contorno ilimitado”.

Daí você percebe as maiúsculas que se igualam ao conjunto da “criação divina” não pessoal, mas universal. Sistema, Totum e Quantum. Para os teólogos tradicionais do catolicismo era a tentativa de substituição da santíssima trindade.

Chardin foi perseguido e exilado. Sua obra proibida pela igreja católica. No papado humanístico de João XXIII ele teve sua inclusão canônica restaurada. Reconhecido como filósofo e pensador e não mais como herege. Roncalli foi o papa mais próximo do Homem. E se Deus existe, foi o único papa escolhido por Deus, nos tempos modernos.

Nos tempos do rincho, a filosofia perdeu morada. Despejada pelo mercantilismo mais imediato e estomacal. O que vale é a esperteza, a mentira, o engodo.

As igrejas vendendo lotes no céu aos bobos para edificar na terra o céu de pastores e clérigos. A salvação é a grana. O paraíso perdido é uma conta bancária vazia.

Não há limites para a esperteza. E quem não se aliar aos novos tempos ingressa no bloco dos bestas.

“Lasciate ogni esperanza, voi ch’entrate”. Té mais.

NOTA DO BLOG: Eu não, mas presencio a enganação.

Um comentário:

  1. Uma senhora aula...não aprende quem não quiser. Abraço de Margarida Lemos.

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